Geo Síntese

Avanços Ambientais em 2024: Um Ano de Esperança para o Planeta

Apesar de 2024 ter sido mais um ano marcado por extremos climáticos, desastres naturais e frustrações diplomáticas nas cúpulas ambientais, também foi um período de conquistas significativas para a proteção da natureza e a transição energética. À medida que o mundo enfrenta o agravamento da crise climática e ecológica, alguns marcos históricos e decisões inovadoras nos mostram que um futuro mais equilibrado entre o ser humano e o meio ambiente ainda é possível — e já está em construção.

O Fim de uma Era: Reino Unido Desliga sua Última Usina a Carvão

Um dos símbolos mais poderosos da virada de página em 2024 foi o desligamento da última usina a carvão do Reino Unido, em Ratcliffe-on-Soar, Nottinghamshire. A data de 30 de setembro marca não apenas o fim de uma era para o país que liderou a Revolução Industrial com base no carvão, mas também um ponto de inflexão para toda a Europa Ocidental. Com suas turbinas silenciadas e chaminés sem fumaça, a antiga usina agora passará por um processo de descomissionamento, e existe a proposta de que o local seja convertido em uma instalação de armazenamento de energia.

Este tipo de transição já ocorreu em outras partes do país, como na usina desativada de Ferrybridge C, que foi transformada em um centro de baterias com capacidade de 150 MW — suficiente para abastecer 250 mil residências. Essa reutilização de infraestruturas de combustíveis fósseis representa uma estratégia inteligente e simbólica, que transforma marcos do passado industrial em soluções para o futuro energético.

Energia Renovável: Um Crescimento Acelerado Globalmente

O crescimento das fontes renováveis foi outro destaque do ano. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), o mundo deverá adicionar 5.500 GW de capacidade renovável até 2030, quase triplicando os níveis de 2022. Embora essa previsão ainda fique ligeiramente abaixo da meta das Nações Unidas, a expansão é impressionante — e reflete mudanças profundas nos fundamentos econômicos da energia.

De fato, o diretor executivo da AIE, Fatih Birol, destacou que o “crescimento maciço das renováveis” é impulsionado não apenas por políticas públicas, mas por pura lógica de mercado: hoje, em quase todos os países, a energia solar já é a forma mais barata de gerar eletricidade. Birol resumiu a situação em duas palavras: “China” e “solar”.

A China, inclusive, lidera essa transição com grande folga. Espera-se que o país responda por metade da capacidade renovável acumulada do mundo até o fim da década, construindo um “trem-bala energético” para acomodar sua crescente demanda limpa. Isso mostra como a geopolítica climática está se redesenhando, com novos protagonistas e novos interesses.

Natureza com Direitos: Avanços Jurídicos em 2024

Paralelamente à transição energética, a questão dos direitos da natureza ganhou força inédita. Em 2024, cresceu o número de elementos naturais que receberam personalidade jurídica — ou seja, passaram a ser reconhecidos legalmente como sujeitos de direitos.

No Equador, país pioneiro nesse conceito, o governo reafirmou que a mineração na floresta de Los Cedros violava os direitos da natureza. Outra decisão afirmou que a poluição do rio Machángara, em Quito, infringia seus direitos fundamentais. Essas resoluções têm potencial transformador e estão embasadas em uma concepção inovadora de justiça ecológica.

Na Nova Zelândia, os picos do Parque Nacional Egmont — agora renomeado Te Papakura o Taranaki — foram reconhecidos como entidades ancestrais com personalidade jurídica. No Brasil, a cidade de Linhares declarou parte do oceano e suas ondas como entes vivos com direito à regeneração. E no Pacífico, baleias e golfinhos passaram a ser oficialmente tratados como “pessoas legais”, graças a um tratado liderado por povos indígenas.

Essas iniciativas simbolizam uma mudança de paradigma: saímos da visão antropocêntrica, onde a natureza é objeto, para um modelo biocêntrico, em que os seres não humanos possuem valor intrínseco e merecem proteção autônoma.

Proteção Marinha: O Novo MPA dos Açores

No Atlântico Norte, os Açores anunciaram a criação da maior Área Marinha Protegida (AMP) da região. Abrangendo cerca de 287 mil km², metade dessa zona será totalmente protegida, enquanto a outra metade terá restrições significativas à exploração. A região abriga nove fontes hidrotermais, 560 espécies de peixes e 28 mamíferos marinhos.

Apesar de sua eficácia, as AMPs ainda são subutilizadas. Apenas 2,8% dos oceanos do mundo estão efetivamente protegidos hoje. Este novo projeto, portanto, representa um avanço estratégico e necessário para frear a erosão da biodiversidade marinha.

Redução do Desmatamento na Amazônia

Uma das notícias mais animadoras veio da floresta tropical mais importante do mundo. O desmatamento na Amazônia brasileira caiu mais de 30% em 2024, atingindo seu nível mais baixo em nove anos, segundo o INPE. Ainda que mais de 6 mil km² tenham sido destruídos, essa redução é significativa, especialmente diante do aumento expressivo de incêndios florestais devido à seca.

Essa melhora coincide com os compromissos firmes do governo Lula para combater a extração ilegal e zerar o desmatamento até 2030, consolidando a importância de liderança política comprometida com a sustentabilidade.

Iniciativas Locais e Resultados Globais

Em nível global, uma revisão de 665 projetos de conservação revelou que dois em cada três surtiram efeitos positivos. Um caso emblemático é o da Iniciativa de Conservação de Altyn Dala, no Cazaquistão. O projeto tirou o antílope Saiga do risco de extinção, elevando sua população de 20 mil indivíduos em 2003 para quase 3 milhões em 2024.

Na América do Norte, a Tribo Yurok obteve vitórias históricas. Em agosto, ocorreu a remoção da última das quatro barragens do rio Klamath, e em outubro, salmões voltaram a subir o rio após um século de ausência. Ao mesmo tempo, a tribo ampliou a população de condores da Califórnia, aves sagradas para o povo Yurok, com 18 indivíduos já vivendo em liberdade.

Esses casos demonstram como ações locais — quando guiadas por conhecimento científico, saberes tradicionais e compromisso político — podem gerar impactos globais na proteção da biodiversidade.