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O Triângulo do Lítio: O Novo Eldorado da América do Sul

O Salar de Uyuni, na Bolívia, destaca-se como a maior salina do mundo e é um dos locais mais ricos em lítio globalmente. Este mineral precioso está se tornando o novo “El Dorado” da América do Sul, substituindo o mítico tesouro dourado que os europeus buscavam há quinhentos anos. Tim Marshall observa que, ao contrário do Eldorado lendário, a abundância de lítio é uma realidade concreta e bem localizada.

Hoje, o foco global está voltado para o Triângulo do Lítio, uma região que abrange partes do Chile, Argentina e Bolívia, e que concentra quase 60% das reservas mundiais desse metal. O lítio, uma substância branca e prateada, desempenha um papel crucial na transição de combustíveis fósseis para fontes de energia renovável. É fundamental para a fabricação de baterias recarregáveis, utilizadas em veículos elétricos e para armazenar energia gerada por parques eólicos e solares. A demanda por lítio está projetada para crescer cinco vezes até 2030 e continuar sua trajetória ascendente posteriormente.

Embora o Chile, a Argentina e a Bolívia possuam vastas reservas de lítio, há um desafio significativo: a China domina o mercado de refino e produção de produtos derivados do lítio. Atualmente, a China compra a maior parte do lítio extraído na América Latina e refina mais de 50% da oferta global. Além disso, o país fabrica 79% das baterias de íons de lítio do mundo.

A invasão russa da Ucrânia revelou aos governos europeus, particularmente à Alemanha, os riscos associados à dependência de um único fornecedor de energia. Essa experiência, somada à dependência econômica de Berlim de sua indústria automobilística, levou o chanceler Olaf Scholz a visitar recentemente o Chile e a Argentina. Na companhia de uma grande delegação de negócios, Scholz firmou vários acordos, com destaque para a cooperação em “mineração sustentável”. Esses acordos visam reduzir a dependência da China e desafiar seu domínio na América do Sul.

A estratégia da Alemanha envolve investimentos na construção de fábricas de refino de lítio na Argentina e no Chile, permitindo que o país europeu compre o produto refinado diretamente desses países. Esse movimento alinha-se com os altos padrões ambientais da Alemanha, oferecendo uma vantagem competitiva significativa na disputa com a China pelos contratos de lítio.

A China, por sua vez, tem aproveitado a ausência de empresas europeias para expandir suas cadeias de suprimento e investir consideráveis quantias em empresas locais. Por exemplo, a Tianqi, uma gigante especializada em lítio, possui 28% da SQM, a maior empresa química do Chile.

Enquanto a China também busca cobalto e outros metais preciosos na África, a América Latina está se tornando um foco crescente para os europeus e outras nações. No final do ano passado, a União Europeia assinou um acordo com o Chile para maior acesso ao lítio e ao cobre. Os Estados Unidos, Canadá, Austrália e Coreia do Sul também estão presentes no Triângulo do Lítio, refletindo a crescente importância da região no mercado global.

Apesar de possuir as maiores reservas de lítio, a Bolívia tem sido um player menor no mercado devido à instabilidade política, à má administração das empresas e à percepção de um ambiente hostil aos investidores. No entanto, essa situação está mudando. O presidente Luis Arce recentemente firmou um acordo de investimento de US$1 bilhão com um consórcio chinês para explorar alguns dos 21 milhões de toneladas de depósitos conhecidos do país, com a promessa de que as baterias de lítio serão produzidas na Bolívia.

Dados do Serviço Geológico dos EUA indicam que, após a Bolívia, a Argentina possui as maiores reservas de lítio (19 milhões de toneladas), seguida pelo Chile (9,8 milhões), EUA (6,8 milhões), Austrália (6,3 milhões) e China (4,5 milhões). O Reino Unido possui depósitos menores, principalmente na Cornualha, insuficientes para justificar a mineração em larga escala. No entanto, está prevista a construção da primeira refinaria de lítio do Reino Unido em Teesside, com planos para produzir hidróxido de lítio suficiente para um milhão de veículos elétricos por ano. Se bem-sucedida, a refinaria poderá se tornar a única na Europa, reduzindo a dependência de produtos chineses.

Historicamente, países que dominaram a produção de carvão, gás e petróleo conseguiram se posicionar como economias líderes. Agora, o “ouro branco” do lítio, junto com outros metais como cobre e prata, tem o potencial de conferir um papel semelhante aos países que possuem essas riquezas em abundância.

Consequentemente, vários governos sul-americanos enfrentam a oportunidade de negociar acordos desafiadores e transformar suas economias, possivelmente alterando o equilíbrio de poder global. As “riquezas não contadas” foram encontradas e prometem redefinir o cenário econômico e geopolítico.

 



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